A escravidão passou e ficaram as suas marcas.

Neste dia 20 de novembro a nação brasileira celebra o Dia Nacional da Consciência Negra. É celebração porque a memória desta data é fruto da luta do povo negro que a compreende como significativa devido a morte do grande líder negro Zumbi dos Palmares.

Os afro-brasileiros somam, segundos dados do IBGE, mais da metade da população brasileira. É sabido da contribuição significativa dada por este povo na construção e na identidade deste país. Foi uma contribuição marcada pelo sofrimento porque a chegada dos antepassados nestas terras não aconteceu por livre vontade, mas caracterizada pelo flagelo da escravidão. A escravidão passou e ficaram as suas marcas. No período pós abolição o Estado brasileiro não se esmerou em nenhuma forma de reparação.  Os negros saíram da escravidão sem as mínimas condições de existência digna. Denunciar este pecado histórico não é vitimar, mas consciência da dívida que a nação tem para com o povo negro. Com esta consciência histórica é celebrado o vinte de novembro, Dia da Consciência Negra.

Alegremo-nos com as muitas conquistas do povo negro, fruto da luta e articulação social. Elas estão presentes no sistema de cotas; na presença dos jovens negros nas universidades públicas; no sistema de saúde que compreende as enfermidades próprias da genética negra, atuando na prevenção e no tratamento; no reconhecimento da cultura de origem afro brasileira como patrimônio do país; na obrigatoriedade do ensino da história e cultura africana nas unidades de ensino, dentre outras conquistas. Sabemos que não vieram gratuitamente. São fruto da luta, articulação política e diálogo com a sociedade.

Atualmente as conquistas têm sido ofuscadas por sombras. Preocupa-nos o total descompromisso do governo federal para com o povo negro. Este descompromisso passa pela má vontade em relação a regularização dos territórios quilombolas, sucateamento do sistema de saúde e diminuição de verbas para a educação além de nenhuma iniciativa expressiva para coibir a violência contra a juventude negra.

É dolorido saber que o racismo é disseminado sem nenhum subterfúgio, como se não soubessem que tal racismo é responsável não só pelo sofrimento existencial, mas pelo impedimento dos negros acessarem seus direitos. O racismo gera violência e os dados asseguram o aumento da mortalidade, sobretudo dos jovens negros.  Também se manifesta na intolerância em relação às manifestações religiosas de matriz africana. É resultado de um processo pernicioso onde a escravidão dos corpos escravizou as mentes e insiste em escravizar o futuro. Não é possível que isto continue. Enquanto Igreja denunciamos a prática da discriminação e racismo em suas diferentes expressões, pois ofende no mais profundo a dignidade humana criada à imagem e semelhança de Deus (cf. DAp 533)

Neste contexto de celebração, memória e reafirmação de compromissos a Igreja manifesta seu apoio irrestrito às lutas do povo negro e faz isso fiel a sua tradição de ser advogada da justiça e defensora dos pobres (cf. DAp 395). Fiel ao mandato recebido de Jesus Cristo continua sua missão e se dispõe conhecer os valores culturais, a história e as tradições dos afro-americanos. Para tanto compreende que entrar em diálogo fraterno e respeitoso como eles é um passo importante na missão evangelizadora (cf. DAp 532).

Que Nossa Senhora Aparecida, nossa mãe negra, continue cuidando de todos nós e fazendonos solidários e atenciosos à luta do povo negro!

Dom José Valdeci Santos Mendes – Bispo de Brejo – MA – 

Presidente Comissão Episcopal Pastoral para a Ação Sociotransformador

fonte: cnbb sul 1